Um ano depois de sete ordens de profissionais denunciarem a “desregulação completa” da publicidade a actos e serviços de saúde, com a multiplicação de anúncios a consultas e rastreios gratuitos, o Conselho de Ministros aprovou esta quinta-feira o projecto de decreto-lei que vem estabelecer regras e proibições nesta área. Passam a ser “proibidas as práticas de publicidade de saúde que, por qualquer razão, induzam ou sejam susceptíveis de induzir em erro o utente quanto à decisão a adoptar”, resume o Ministério da Saúde sobre o projecto de diploma agora aprovado.
A intenção inicial do projecto que visa regular a publicidade em saúde era o de vedar menções publicitárias do tipo “primeira consulta grátis”, rastreio “sem encargos”, ou tratamentos “em promoção”. Como a versão final do projecto não foi disponibilizada, é impossível perceber quais são as proibições aprovadas. O Ministério da Saúde adianta apenas que são enunciadas neste diploma as práticas consideradas “enganosas”, sem depois as especificar. O que se fica a saber é que passam a ser vedadas “condutas que pressuponham ou criem falsas necessidades de consumo”.
O projecto de decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros (que abrange a publicidade a terapêuticas convencionais e não convencionais, incluindo exames e análises, tratamentos ou terapias) estipula que esta se deve reger pelos princípios da “transparência, fidedignidade e licitude, objectividade e rigor científico” e refere que cabe à Entidade Reguladora da Saúde a fiscalização e instrução de eventuais processos de contra-ordenação.
Na proposta enviada aos parceiros e a que o PÚBLICO teve acesso, dentro do universo das proibições figuram os anúncios que descrevam o acto ou serviço como “grátis, gratuito, sem encargos ou com desconto ou promoção, fazendo depender, directa ou indirectamente, a gratuitudade ou desconto de prestações sucessivas”.
Também passam a ser proibidos (se a proposta inicial não foi alterada em Conselho de Ministros) os anúncios que sejam susceptíveis de induzir o utente “ao consumo desnecessário ou nocivo”, por exemplo através de “sistemas de pontos, cartões de angariação, promoções ou planos de prestação de serviços” e ainda os que divulguem os actos e serviços de saúde “sob a forma de atribuição ou de condição de prémios e similiares, resultantes de concursos ou sorteios”.
Foi o Conselho Nacional das Ordens Profissionais (que integra as ordens dos médicos, enfermeiros, biólogos, farmacêuticos, médicos dentistas e nutricionistas e psicólogos) que em 2014 que exigiu que fossem adoptadas “medidas urgentes para pôr cobro à desregulação que se verifica na publicidade a serviços de saúde”. O ministro da Saúde decidiu, então, criar um grupo de trabalho com representantes das ordens e de várias autoridades de saúde, além da associação de defesa do consumidor Deco.
O bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, Orlando Monteiro da Silva, traçava na altura um quadro “preocupante” citando, como exemplos da desregulação neste sector, a publicitação de serviços gratuitos, como rastreios e check-ups usados para “induzirem tratamentos desnecessários”, a publicidade a cartões de pontos em supermercados e gasolineiras com descontos em saúde e promessas de cura para doenças crónicas.
Ouvido agora a propósito do diploma aprovado em Conselho de Ministros, Orlando Monteiro da Silva prefere não comentar um documento que ainda não conhece – “não sei qual foi o resultado final” – mas vai dizendo que espera que o diploma seja “claro, transparente e passível de ser entendido” e aplicado.
“É preciso pôr ordem nisto”, reclama, notando que há “casos dramáticos” de pessoas que foram induzidas artificialmente a consumir actos de saúde. “A publicidade em saúde não pode ser selvagem e prometer actos gratuitos que depois se revelam não gratuitos ou resultados garantidos que não se concretizam, enfatiza. O problema, frisa ainda, é que esta regulação “não interessa a alguns grandes grupos económicos ,alguns dos quais vivem destescheck-ups“.
Fonte: Público, 13 de agosto de 2015