Ministério da Saúde assina acordo de cinco anos com oito misericórdias dos distritos do Porto e Braga. Manuel Lemos exorta ministro a replicar protocolo nas outras regiões do país.
A dois meses das eleições, no mesmo dia em que oficializou a dotação de 22 milhões de euros para a recuperação de cirurgias em atraso no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o ministro Paulo Macedo assinou protocolos com oito misericórdias para a realização de consultas e operações no valor de 25 milhões, só em 2016. O acordo foi assinado por cinco anos. Como a quantia não deverá sofrer grandes alterações, o montante global será da ordem dos 125 milhões de euros, adiantou o presidente da Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte, Álvaro Almeida.
Na prática, isto significa que os doentes que forem referenciados por centros de saúde para os hospitais das santas casas de Vila Verde, Fão, Felgueiras, Riba D´Ave, Póvoa de Lanhoso, Marco de Canavezes, Lousada e Esposende ao longo dos próximos cinco anos vão ter acesso a consultas e, também, a cirurgias nestas unidades do sector social, explicou. “São oito hospitais que passam a ser do SNS e em que os utentes apenas têm que pagar a taxa moderadora”.
De manhã, na cerimónia de assinatura do protocolo com as oito misericórdias dois distritos do Porto e de Braga, o ministro da Saúde não aludiu a quaisquer números. Foi a Álvaro Almeida que coube explicar os meandros da negociação. Com a assinatura deste acordo-chapéu, disse, “alarga-se o leque dos serviços prestados aos utentes do SNS”, estando previstas 91 mil consultas externas e 13 300 cirurgias, em especialidades como a cirurgia geral e plástica, oftalmologia, otorrinolaringologia e urologia.
O acordo, acrescentou, inclui ainda “um vasto leque de meios complementares de diagnóstico e terapêutica e o acesso a serviços de atendimento permanente em horários complementares ao funcionamento dos centros de saúde locais”.
Mais tarde precisou que os protocolos se inserem numa negociação com “o grupo Misericórdias Saúde” e que as consultas de cuidados de saúde primários “estão em cima da mesa” mas, para já, não foram incluídas. Fez também questão de sublinhar que tudo isto não passa da renovação de um acordo “que foi assinado [em primeiro lugar] pelos socialistas”, antes de este Governo ter entrado em funções.
O presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, lembrou, porém, que estes “novos acordos” vêm dar resposta ao estabelecido no decreto-lei nº 138/2013 de 9 de Outubro. E exortou o ministro a “dar instruções às restantes ARS” para que este “novo modelo de acordo” seja replicado noutros hospitais das misericórdias. “Convém que se desenganem os que pensam que o Estado e o Governo estão a fazer um favor às misericórdias ou que estamos no plano da caridadezinha em sede de políticas de saúde”, disse, em resposta aos que têm contestado a entrega ou o anúncio da transferência de serviços e de unidades do Serviço Nacional de Saúde para o sector social. “Quem não percebe isso está preso a pressupostos ideológicos serôdios”, criticou.
Três hospitais transferidos, dois em vias de “devolução”
Esta semana, o Governo deu mais um passo no caminho iniciado em 2014 com a prometida “devolução” de vários hospitais do SNS às misericórdias, ao oficializar a transferência da unidade de São João da Madeira para a misericórdia local, depois de o mesmo ter acontecido já com os hospitais de Anadia, Serpa e Fafe.
A assinatura deste protocolo ficou marcada por um protesto popular “de luto” promovido por um movimento cívico que reclama a manutenção da administração do Estado e elaborou uma petição subscrita por mais de nove mil cidadãos. Não se sabe se a contestação terá algum resultado. O que o ministro e o presidente da ARS Norte disseram é que o acordo está formalizado e que a “devolução” se vai concretizar em 1 de Janeiro do ano que vem.
O próximo hospital a transferir deverá ser o de Santo Tirso, mas aqui a oposição está a ser mais intensa. Interpelado pelos jornalistas, Paulo Macedo disse que esta “devolução” está já em fase final de negociação, ao mesmo tempo que garantiu que não haverá despedimentos e que até serão “mantidas ou aumentadas valências” naquela unidade.
A Ordem dos Médicos e os sindicatos dos médicos da região Norte contestam a transferência. Após uma visita ao hospital de Santo Tirso, constataram que falta ali “cerca de uma dezena de médicos” e que a passagem prevista para a misericórdia poderá levar à diminuição de várias especialidades. O presidente do conselho regional do Norte da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, deu o exemplo da cardiologia, da obstetrícia, da oftalmologia, da oncologia médica, da otorrinolaringologia, da pneumologia e da pedopsiquiatria como valências que esta unidade poderá vir a perder.
A administração do hospital queixou-se da “dificuldade em manter recursos humanos”, revelou Miguel Guimarães, citado pela Lusa. “É difícil dar um número, mas faltam seguramente mais de uma dezena de médicos e objectivamente 14 enfermeiros”, apontou o mesmo responsável da Ordem, que foi acompanhado na visita por representantes do Sindicato Independente dos Médicos e do Sindicato dos Médicos do Norte.
Fonte: Público, 1 de agosto de 2015