Perante a redução do valor pago pelas horas extraordinárias, os médicos ponderam recusar-se a trabalhar além do horário normal, o que poderá afectar o funcionamento de vários sectores do Serviço Nacional de Saúde, em especial as urgências.
O alerta é feito pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM) e pelo Sindicato Independente dos Médicos (SIM) que, num comunicado conjunto, explicam que numa reunião que teve lugar na passada quarta-feira, 7 de Dezembro, analisaram “as gravosas implicações para o Serviço Nacional de Saúde e para os médicos das medidas decorrentes da recente aprovação do Orçamento do Estado para 2012”.
As estruturas acusam o Governo de “unilateralmente” ter decidido “rasgar o que havia sido acordado em sede de Acordos Colectivos de Trabalho negociados em 2009. Nomeadamente, no que diz respeito ao valor por que devem ser pagas as horas extraordinárias”.
O PÚBLICO tentou ouvir a FNAM e o SIM, até ao momento sem sucesso. Mas à Lusa, Pilar Vicente, da FNAM, adiantou que os médicos estão contra a realização de horas extraordinárias sem limite e a redução do valor pago por esse trabalho. Até agora os médicos podiam ter de fazer até 12 horas suplementares por semana – um limite que, segundo a sindicalista, deixa de existir. Quanto a montantes, o valor mínimo pago pela primeira hora era de 13 euros e das seguintes de 22 euros, passando agora para 11 e 12 euros, respectivamente.
A FNAM e o SIM sublinham, no mesmo comunicado, que “é fundamental ter presente que os hospitais não têm qualquer hipótese de funcionar sem que os médicos prestem anualmente um número muito significativo de horas extraordinárias, que vai muito além do que está estatuído na generalidade dos trabalhadores portugueses”.
A federação e o sindicato asseguram que em Outubro alertaram o Ministério da Saúde para os problemas que tal decisão poderia vir a criar e, por isso, dizem sentir “toda a legitimidade para dinamizar a classe para formas de luta, que podem inclusive assumir a forma de recusa à prestação de todo e qualquer serviço extraordinário”.
As estruturas já solicitaram audiências urgentes ao Presidente da República e à comissão parlamentar de Saúde, com o objectivo de exporem “o momento grave que se avizinha para o Serviço Nacional de Saúde”.
A redução do número de horas extraordinárias realizadas nos hospitais públicos e do respectivo montante pago pelas mesmas faz parte do memorando de entendimento assinado entre Portugal e a troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu).
A despesa com horas extraordinárias nas unidades do Serviço Nacional de Saúde tem vindo a crescer ao longo dos anos, como forma de compensar as muitas aposentações e saídas de médicos e enfermeiros para o sector privado. Em 2010 os gastos com horas extraordinárias ultrapassaram os 300 milhões de euros. No memorando estava inicialmente previsto que os custos nesta rubrica fossem reduzidos em 10% em 2012, medida que o governo antecipou para este ano. Na actualização do memorando, em Setembro, a meta passou a ser 20% em 2012 e 20% em 2013. As unidades pouparam até Setembro 12,79% em trabalho extraordinário, cerca de 33 milhões de euros, para um total de 228 milhões de euros. No ano passado a factura rondava os 261 milhões. O corte nos médicos representa dois terços da poupança, 23 milhões.
Fonte: Público, 09 de Dezembro de 2011