Plataforma de organizações não governamentais europeias e especialistas portugueses querem “melhoria” da proposta de alteração da lei do tabaco
“Consternados” com a proposta de revisão à lei do tabaco aprovada na semana passada pelo Governo português, responsáveis de uma plataforma de organizações não-governamentais (ONG) de saúde europeias e vários especialistas portugueses reclamam a urgente “melhoria” das alterações previstas. Em comunicado divulgado esta terça-feira,a direcção da plataforma antitabagista Smoke Free Partnership (Parceria Sem Fumo) mostra-se “preocupada” sobretudo com a moratória até 2020 e com as excepções previstas na proposta de alteração da lei do tabaco.
O Conselho de Ministros aprovou na semana passada esta proposta de lei – que prevê a proibição dos cigarros electrónicos com nicotina e alarga a interdição de fumar aos espaços públicos fechados “com serviço”, dando cinco anos para a adaptação dos estabelecimentos que investiram em obras e em sistemas de exaustão de forma a poderem ter zonas para fumadores. .
A partir dessa altura, se a proposta não for alterada no Parlamento (onde ainda vai ser discutida e votada), será possível continuar a fumar mas apenas em espaços compartimentados e separados, sem serviço de bar ou restauração, do tipo dos “aquários” que já existem nos aeroportos. Já nos hotéis 40% dos quartos podem continuar a ser para fumadores, explicou na altura o secretário de Estado adjunto do ministro da Saúde, Fernando Leal da Costa.
É contra estas “extensas” excepções e a moratória de cinco anos que se insurgem os responsáveis pela plataforma europeia. Até porque, alegam, ambos foram decididos ”sem consulta pública ou recomendações da comunidade científica ou médica” e terão “resultado da pressão da indústria tabaqueira sobre o Governo português”.
Para a directora da Smokefree Partnership, Florence Berteletti, a proposta de lei “não só não consegue melhorar as condições para a protecção dos cidadãos contra o fumo do tabaco como também introduz um atraso desconcertante na [sua] implementação”. “Quando as autoridades de saúde estão preocupadas com o bem estar da indústria do tabaco, é claro que há algo de podre em Portugal”, sustenta. Florence Berteletti lamenta ainda que Portugal apresente uma proposta deste tipo, “dez anos após a primeira proibição global na Europa, e com a maioria dos Estados-membros a apresentarem excelentes leis para ambientes livres de fumo de tabaco”. O Governo português “perdeu uma oportunidade para melhorar” a legislação.
O Governo “não consultou os especialistas em saúde pública” sobre esta matéria, garante Sofia Ravara, coordenadora do Movimento de ONG portuguesas pelo controlo do tabaco, também citada neste comunicado. A médica pneumologista mostra-se preocupada com “a possibilidade de o Parlamento poder vir ainda a acrescentar mais excepções”, quando a proposta ali for debatida.
Hilson Cunha Filho, co-coordenador deste movimento português, vai mais longe quando afirma que haverá “evidências” de que o Governo, ao mesmo tempo que ignorou os especialistas em saúde pública, “consultou a indústria da restauração e hotelaria sobre a proposta”, o que demonstra “um flagrante desrespeito pela saúde pública da parte daqueles que deveriam protegê-la” e ainda “viola os princípios básicos da democracia”.
Estes especialistas notam que, a ser aprovada neste moldes, a legislação portuguesa irá “contrariar toda a evidência” mundial que atesta que “só a proibição abrangente em todos os locais públicos é eficaz na protecção das pessoas contra a exposição ao fumo do tabaco” .
De acordo com a proposta de lei aprovada em Conselho de Ministros e que transpõe duas directivas da União Europeia, além do alargamento da proibição de fumar nas áreas com serviço, passa a ser obrigatório colocar imagens dissuasoras nos maços de tabaco e deixa de ser possível a existência de menções como “light” ou “slim”. Também serão regulados os cigarros electrónicos, proibindo-se os que têm nicotina nos locais públicos.
Fonte: Público, 28 de Abril de 2015