Petição foi entregue na Assembleia da República por associações que representam doentes com esclerose múltipla, hepatite C ou artrite reumatóide. Queixam-se de tratamentos negados em hospitais ou de trocas por fármacos que dizem ser diferentes dos que tomavam.
Um conjunto de associações de doentes entregou nesta quarta-feira na Assembleia da República uma petição que pretende acabar com a barreira que consideram haver à livre prescrição de medicamentos por parte dos médicos nos hospitais para doenças como a esclerose múltipla, a hepatite C ou a artrite reumatóide, em que os fármacos são dispensados gratuitamente nas próprias unidades.
A “Petição pelo fim da proibição de prescrição de medicamentos nos hospitais” foi criada há seis meses e conta com 5400 assinaturas, como explicou ao PÚBLICO o presidente da TEM – Associação Todos com a Esclerose Múltipla, Paulo Alexandre Pereira, e que tem encabeçado o processo. O documento foi recebido pelo vice-presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e será encaminhado para a comissão de Saúde, que nomeará depois um relator para avaliar o seu conteúdo.
Paulo Alexandre Pereira adiantou que a petição reúne, por uma questão de estratégia, associações de doentes de várias áreas que estão a ser afectadas pelas mudanças na dispensa de medicamentos nos hospitais. “No caso da hepatite C, há hospitais, como o S. João, que simplesmente não dão medicamentos, enquanto na esclerose múltipla o problema é que os conselhos de administração mudaram os medicamentos comprados e os doentes são obrigados a trocar de medicação e correm o risco de deixar de estar estáveis”, acrescentou, lembrando que a adaptação aos efeitos secundários pode demorar meses ou levar mesmo a novos surtos.
A petição é o culminar de uma série de alertas públicos que as várias associações têm feito e pretende pôr fim “à alteração levada a cabo pelos hospitais, da medicação a doentes crónicos. A par da não-evidência científica sobre a equivalência dos medicamentos substituídos, a alteração coerciva da medicação é contrária às normas de orientação clínica sobre a prescrição da medicação, em doentes crónicos”.
Porém, tanto o Ministério da Saúde como a Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) têm assegurado que os doentes têm acesso aos fármacos de que precisam e que só estão a ser substituídos medicamentos considerados equivalentes.
“É preciso ter a sorte de se morar da rua certa”
Além disso, Paulo Alexandre Pereira considera que a situação é “extremamente injusta” pois, “apesar de o preço ser similar em muitos dos medicamentos, é preciso ter a sorte de se morar da rua certa para se ter acesso ao hospital que o tem”, voltando a referir-se ao Hospital de S. João, no Porto, como exemplo de uma instituição que fica a uma curta distância do Hospital de Santo António e onde o leque de fármacos é maior. Ou o caso do Hospital de Braga, onde diz que só quem começou tratamentos para a esclerose múltipla antes de 2011 com determinados medicamentos os poderá manter.
A própria petição refere, por isso, que “existe desigualdade entre os doentes, consoante o hospital em que estão a ser tratados”, e pretende que “não seja permitida a troca de medicação, sem a aprovação do médico que assiste o doente, sendo também disponibilizada, nos hospitais onde exista essa consulta, a melhor medicação (aprovada pelo Infarmed) e a mais adequada, de acordo com o médico assistente e o próprio doente”.
Segundo o presidente da TAM, o que está a acontecer é que, apesar de o Infarmed ter vários medicamentos aprovados para uma patologia e de as normas de orientação clínica (NOC) da Direcção-Geral da Saúde especificarem os diferentes casos em que devem ser aplicados, “as comissões de farmácia e terapêutica estão a restringir a lista e a ir contra as boas práticas clínicas, violando inclusive as próprias NOC e as especificidades dos doentes”. Os signatários da petição criticam também a composição da Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica: “Em 24 pessoas, existe apenas uma neurologista. Será que essa médica domina tudo sobre Alzheimer, Parkinson, epilepsia?”, pergunta o representante.
Questionado sobre se os médicos não têm tido um papel activo a travar estas situações, Paulo Alexandre Pereira ressalvou que os próprios clínicos “são pressionados pelos conselhos de administração, vêem-se cada vez mais confrontados com ameaças de processos disciplinares e com contratos precários”.
Fonte: Público, 4 de Dezembro de 2013