Apesar de trabalhar há ano e meio no Centro de Saúde da Baixa da Banheira, Moita, Vanessa Lourenço, 25 anos, pensa fazer as malas e procurar futuro melhor no estrangeiro, ao lado do namorado, também enfermeiro. Uma vontade que ganha cada vez mais sentido também para os colegas Tiago Seixas, 25 anos, que trabalha há meio ano no Centro de Saúde do Laranjeiro, e Joaquim Leitão, 28 anos, que saiu em Junho da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados do Barreiro e está desempregado após dois anos e meio de serviço.
Todos são unânimes em afirmar ao CM o que os empurra para fora do País: a crise, a falta de emprego que afecta 3000 profissionais e a precariedade da profissão, com remunerações que não chegam aos quatro euros à hora e sem direito a subsídio de férias ou de Natal.
Outros já decidiram emigrar e o número de profissionais que pediu autorização à Ordem dos Enfermeiros para trabalhar em outro país disparou em 2012. A manter-se o ritmo de pedidos, até ao final do ano será o dobro dos pedidos em relação a 2011. De Janeiro a Agosto deste ano a Ordem dos Enfermeiros recebeu 1344 pedidos, enquanto em 2011 foram 1724 enfermeiros a querer emigrar.
Joaquim Leitão foi um dos enfermeiros tarefeiros contratados pelo Estado através de empresas de recursos humanos e que está desempregado. Afirma ao CM que parte se não arranjar emprego em Portugal até final de Setembro. “Não é possível fazer uma gestão de vida com 175 euros mensais, porque o resto do salário vai para os descontos do Fisco e Segurança Social.”
Tânia Martins, 26 anos, e Andreia Mesquita, 23 anos, ambas enfermeiras no Centro de Saúde de Sacavém, dizem ser “impossível viver com 370 euros por mês, depois de feitos os descontos”. Vivem com a ajuda dos pais.
“Não faz sentido o Estado investir na nossa formação, os pais gastarem dinheiro nos nossos estudos, e depois sermos obrigados a emigrar e quem beneficia com a qualidade da prestação dos nossos cuidados são os estrangeiros”, critica Tiago Seixas.
Em finais de Julho, os enfermeiros tarefeiros montaram um hospital de campanha na Baixa de Lisboa, onde fizeram rastreios gratuitos à população e manifestaram o seu descontentamento contra a precariedade na profissão que escolheram.
Queixas devido a casos de fraude
O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) já recebeu queixas de profissionais recrutados por empresas para trabalharem no estrangeiro e que se sentiram enganados.
Guadalupe Simões, coordenadora do SEP, afirmou ao CM que vários enfermeiros queixaram–se após terem assinado um contrato para exercerem funções como enfermeiros mas quando chegaram aos países viram-se confrontados com a exigência de terem de exercerem funções de auxiliares em casas de repouso.
“São situações de fraude que devem ser denunciadas e repudiadas”, sublinhou Guadalupe Simões. O SEP tem vindo a alertar os enfermeiros para os cuidados a ter em relação aos contratos propostos e, alerta a dirigente sindical, para os casos em que as empresas retêm os passaportes aos enfermeiros. Não há casos conhecidos entre portugueses.
Discurso directo: Germano Couto, Bastonário dos Enfermeiros
“Há falta de visão política em Portugal”
Correio da Manhã – Como vê a emigração dos enfermeiros?
Germano Couto – Com grande preocupação. O País e as famílias investiram na formação dos jovens e os serviços precisam deles. Devido à austeridade e à falta de visão política, os profissionais, altamente qualificados, são forçados a trabalhar fora do País.
Fonte: Correio da Manhã, 18 de Agosto de 2012