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Desemprego deve chegar à classe médica já em 2014

Vagas para especialização não chegam para os médicos que estão a ser formados. Emigração é cada vez mais uma saída

 

Com a capacidade formativa das faculdades de Medicina portuguesas “largamente ultrapassada”, os alunos que concorrem às vagas de internato deixaram de ter lugar garantido e não têm como se especializar. Resultado? “Quebra de qualidade” no ensino e nos serviços prestados aos cidadãos e, já a partir do próximo ano, “desemprego médico”.

O alerta é feito por Miguel Guimarães, presidente da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos (SRNOM), que fala de um desequilíbrio entre as vagas para a entrada no curso de Medicina e as vagas para a futura especialização. “Os alunos que estão na faculdade concorrem para as vagas do internato médico, para se especializarem. No próximo ano, já não devem conseguir entrar todos. A medicina como a conhecemos hoje não é compatível com esta situação”, disse Miguel Guimarães ao PÚBLICO, no dia em participou no “1.ºMeeting de Empregabilidade e Empreendedorismo em Medicina”, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).

A situação tende a piorar e, “a partir do próximo ano, já deverá haver desemprego médico”. É uma questão numérica, aclara o dirigente: “A capacidade [para o internato] está limitada a 1500/1600 vagas [por ano] e o número de médicos a saírem das faculdades ultrapassa os 1700. Depois há que contar com quem se forma fora do país e depois concorre cá, mais 100 a 140 por ano.”

O cenário leva a que a emigração seja já “uma realidade muito presente na profissão”. Só em 2012, a Ordem dos Médicos recebeu “mais de 1000” pedidos de documentos para trabalhar fora. “Nem todos emigraram, mas isto significa que, pelo menos, ponderam essa hipótese”, lamenta o presidente da SRNOM. Para colmatar o défice de vagas para internato, a emigração é, no entanto, uma solução “extraordinariamente cara” e, só por isso, se seguram mais profissionais no país.

Nuno Ferreira apostou tudo no Brasil. Em 2006, mudou-se para São Paulo e em três anos completou a especialidade que sempre sonhou fazer, oftalmologia. “Não tive vaga no meu país”, justifica. A Universidade Federal de São Paulo acabou por se revelar uma boa aposta – “É um sítio de referência com um serviço completamente dedicado ao ensino” -, mas depois da especialização e de uma passagem por Marselha, o médico de 35 anos decidiu voltar. “Ainda havia alguma disponibilidade quando voltei, há três anos, e montei um serviço de oftalmologia no Hospital de Lamego.” Apesar do emprego relativamente estável, sair do país não é uma hipótese descabida. “Neste país é impossível fazer um projecto a longo prazo, pensamos a um mês, mas a um ano…”

Quem tenta fazer planos a um ano, e mais, é Francisco Silva, a frequentar o 6.º ano do curso de Medicina na Universidade do Porto. A emigração tornou-se tema de conversa entre os alunos e todos sabem de cor quais os países com mais necessidades de importar profissionais de saúde: “França, Alemanha, alguns países do Norte da Europa, como a Finlândia e a Dinamarca, e, claro, os países da comunidade portuguesa.”

Foi por isso que a Associação de Estudantes da FMUP, à qual Francisco Silva preside, organizou o encontro de ontem. “É preciso desconstruir essa ideia de que há profissões imunes à crise. E os médicos para resistirem devem prosseguir os estudos e especializar-se. O problema é que nos estão a cortar essa possibilidade”, lamentou o jovem de 23 anos. Preocupados com o futuro, os estudantes equacionam já “carreiras alternativas” e formas de serem “empreendedores”, diz Francisco Silva.

O presidente da SRNOM tem algumas dicas para dar: “Estes jovens podem ter como alternativa dedicarem-se à investigação, a laboratórios farmacêuticos, têm a possibilidade de se dedicarem ao Health Cluster Portugal para participarem no turismo de saúde e ainda dedicarem-se às novas tecnologias.”

Outra possibilidade, ainda que mais ponderada por quem procura um enriquecimento curricular e pessoal, é a Medicina Humanitária. “A cooperação com os países da comunidade portuguesa foi um dos pontos apontados como estratégicos pelo Governo. Temos aí uma oportunidade de trabalhar nesses países.”

Fonte: Público, 20 de Outubro de 2013

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