Expressões como “grátis”, “gratuito”, “com desconto” ou “promoção” vão tornar-se mais raras na publicidade a produtos e serviços de saúde a partir de 1 de Novembro. Um novo decreto-lei publicado nesta semana em Diário da República muda as regras nesta área, com o objectivo de evitar “condutas que pressuponham ou criem falsas necessidades de consumo”. As promessas de resultados sem base científica também passam a ser proibidas. Quem infringir a legislação arrisca-se a coimas que vão dos 250 aos 44.891 euros.
O diploma tinha sido aprovado em Conselho de Ministros em meados de Agosto, mas só agora o seu conteúdo foi totalmente conhecido. As mudanças surgem um ano depois de sete ordens profissionais terem denunciado a completa desregulação da publicidade a actos e serviços de saúde. Na altura, o Ministério da Saúde informou que o decreto-lei, que surge na sequência de um grupo de trabalho criado pelo ministro Paulo Macedo, proíbe as práticas publicitárias que induzam ou possam induzir em erro os utentes quanto às decisões que devem tomar.
“Toda a área da saúde é marcada por uma forte componente ética. Toda a regulamentação no sector da saúde – que nos últimos anos foi bastante reformada – é marcada pela orientação que é dada por esses princípios éticos. Por isso, faz sentido dotar a publicidade nesta área dos mesmos princípios”, explica Rita Roque de Pinho, responsável pelo departamento de direito da saúde na sociedade de advogados Cuatrecasas, Gonçalves Pereira.
Até agora a publicidade em saúde era regulada pelo Código da Publicidade, acrescenta a advogada, lembrando que as questões éticas acabavam por não acolher resposta, sobretudo no que diz respeito à “vulnerabilidade” dos utentes. A partir do mês que vem os casos passam a ser tutelados pela Entidade Reguladora da Saúde, quando antes eram supervisionados pela Direcção-Geral do Consumidor. Os medicamentos e dispositivos médicos já eram alvo de uma regulação autónoma, que cabe à Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed).
O decreto-lei especifica que a alteração “abrange todas as práticas de publicidade relativas a métodos convencionais e terapêuticas não convencionais, estando assim compreendidos no seu âmbito os meios complementares de diagnóstico e terapêutica, quaisquer tratamentos ou terapias, designadamente os que envolvem o uso de células”. Uma das queixas das ordens profissionais prendia-se precisamente com os rastreios – uma questão particularmente cara à Ordem dos Médicos Dentistas, que se tem queixado do problema.
O diploma argumenta que as alterações pretendem defender os cidadãos da “comunicação comercial” que possa ter um “elevado impacto nas expectativas, em especial em situações de doença e de vulnerabilidade acrescida, contribuindo para o uso por vezes desnecessário ou inadequado de actos e serviços publicitados, com inegável prejuízo para o estado de saúde”. As regras aplicam-se a qualquer “comunicação comercial, televenda e telepromoção”, mesmo que quando ela surge “sob a aparência de informação editorial, técnica ou científica”.
Para Rita Roque de Pinho esta forte atenção às “necessidades em saúde criadas de forma artificial e distorcida” são um dos pontos mais positivos da lei. “A minha apreciação geral é positiva, mas há um ou outro aspecto que poderia ter sido melhor trabalhado”, ressalva a advogada, dizendo que a própria definição que o diploma dá de publicidade em saúde poderia clarificar melhor que inclui, por exemplo, os suplementos alimentares e outros produtos. A advogada considera, ainda, que o diploma não deixa claras quais são as “fontes de informação aceites pela comunidade técnico-científica” em que a publicidade se pode apoiar.
Fonte: Público, 18 de outubro de 2015