Menu Fechar

Ordem denuncia doentes internados no Algarve por falta de ortopedistas

A Ordem dos Médicos acusa o Hospital de Faro de estar com atrasos significativos na resposta aos doentes internados no serviço de ortopedia e que aguardam uma cirurgia. “O Serviço de Ortopedia tem neste momento duas dezenas e meia de doentes internados para operar, não vislumbrando a breve prazo capacidade operatória dos mesmos”, alerta a ordem. O presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar do Algarve admite que há atrasos, mas nega que sejam tão grandes e explica que a falta de anestesistas é o que mais condiciona a actividade daquela unidade de saúde.

Para a Ordem dos Médicos (OM), há uma “inaceitável incapacidade do Conselho de Administração em manter a qualidade assistencial na especialidade de Ortopedia no Hospital de Faro, que não consegue dar resposta atempada aos doentes internados que aguardam cirurgia”. Nas contas deste organismo, desde 2013, o serviço de ortopedia perdeu oito médicos e a falta de ortopedistas e anestesistas tem-se traduzido em menos horas no bloco operatório. Antes chegavam a ser feitas 176 horas por mês e a OM diz que em Agosto o valor caiu para 72 horas e para 102 horas em Setembro – o que considera ser “manifestamente insuficiente para dar resposta tão só e apenas à patologia traumatológica”.

A ordem refere-se mesmo a um “negro quadro” e critica “o silêncio e o imobilismo” do Ministério da Saúde, com “sérios prejuízos para os doentes”. Em muitos casos, a solução passa por transferir os mais de 25 doentes para outros hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), com a ordem a atribuir parte do problema a “uma gestão completamente desastrada dos recursos humanos, que assim que têm outra alternativa deixam o Hospital de Faro”. “Aliás, a má gestão técnica e humana do Conselho de Administração é uma das razões para muitos especialistas recusarem trabalhar no Algarve e optarem por outras soluções ou localizações profissionais”, garante uma nota da OM.

O presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar do Algarve, do qual faz parte o Hospital de Faro, questionado pelo PÚBLICO, garante que perderam apenas dois ortopedistas em Faro e outros dois no Hospital de Portimão e explica que já foram feitas algumas substituições. Pedro Nunes acusa a OM de estar a fazer “um péssimo trabalho”. “A ordem está a intervir manifestamente com carácter político. É impossível que o senhor bastonário e que o Conselho Regional do Sul não saibam que há quatro anos que os hospitais não têm autonomia de contratação”, justifica o também médico.

Para Pedro Nunes, “se há mais ou menos médicos isso não tem a ver com a administração, mas com a organização do país e a forma como os médicos têm sido distribuídos”. O administrador admite que têm carências praticamente em todas as especialidades, mas há uma que se destaca. “Há falta de ortopedistas, mas o gravíssimo problema no Algarve é de falta de anestesistas”, adianta, dizendo que contam com apenas 16 anestesistas “quando a cidade de Coimbra, para 150 mil habitantes, mesmo com Viseu e Aveiro ao lado, tem 110 anestesistas”.

Mais uma vez, Pedro Nunes aponta o dedo à OM: “Há quatro anos a OM tirou idoneidade, sem nenhum motivo aparente, aos serviços de anestesia do Algarve. Como não temos jovens em formação depois também não ficamos com eles. A OM acaba por promover que os internos fiquem só nos grandes hospitais e nos grandes centros”. O administrador desafia o organismo a colaborar com a tutela no sentido de ajudar a uma distribuição nacional dos médicos mais de acordo com as necessidades dos serviços e “menos com os interesses corporativos”.

No caso do Algarve, o médico assegura que o problema não é só a sazonalidade. “O Algarve tem muitos mais habitantes do que os Censos determinam. Seguem as primeiras habitações e temos muita segunda habitação no Algarve que acaba por ser habitação permanente. Neste ano tivemos 17 milhões de dormidas no Algarve. Em Agosto calculava-se que estavam no Algarve 2,2 milhões de pessoas. Mesmo com este acrescido, Pedro Nunes diz que conseguiram responder às urgências, mas com um elevado peso sobre os profissionais de saúde e “risco de burnout”. “Os médicos trabalharam para lá daquilo que se pode esperar”, reconhece.

O cansaço é, aliás, uma das preocupações da OM, que alerta que as escalas do serviço de urgência são muitas vezes desenhadas com um número de médicos abaixo do mínimo. “Além de uma sobrecarga de trabalho enormíssima sobre os profissionais escalados, que ultrapassa o aceitável e aumenta o risco de erro médico devido ao cansaço dos profissionais, obriga à transferência de doentes para o Hospital de referência, Hospital de Santa Maria, levando a uma sobrecarga deste hospital e a um aumento de risco para os doentes”, refere a ordem. Sobre este ponto, Pedro Nunes ressalva apenas um caso “lamentável” de “dois ortopedistas escalados para o serviço de urgência e que faltaram aparentemente sem razão, dando origem a processos disciplinares”.

Um estudo recente da OM alertava precisamente para a falta de anestesistas nos hospitais públicos. Dos mais de 1200 médicos desta especialidade que trabalham nos hospitais do SNS, só cerca de 40% estão nas instituições públicas com um contrato de trabalho de 42 horas e em regime de exclusividade. Há ainda mais 200 profissionais que já só trabalham no sector privado. O trabalho estimava que faltem 467 anestesiologistas em todo o país. Em Março, o ministro Paulo Macedo também já tinha admitido que a tendência de crescimento do SNS em termos de cirurgias não poderá ser mantida “porque não há anestesistas”.

Fonte: Público, 17 de setembro de 2015

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *