O conselho regional do Norte (CRN) da Ordem dos Médicos (OM) disse esta terça-feira que os cursos privados de Medicina “comprometem o futuro da formação médica especializada” e manifestou “profunda preocupação pela qualidade dos cuidados de saúde em Portugal”.
O CRN da OM reagia assim, em comunicado, ao protocolo celebrado entre a Cooperativa de Ensino Superior, Politécnico e Universitário (CESPU) e a universidade espanhola Afonso X, El Sabio, que prevê que alunos da cooperativa portuguesa possam licenciar-se em Medicina naquela universidade a partir de 2012-13.
O documento assinado entre as duas instituições privadas ibéricas, a que a Lusa teve acesso, prevê que, todos os anos, os alunos da CESPU que tenham concluído os três anos da licenciatura em Ciências Biomédicas tenham a possibilidade de prosseguir os estudos no 4.º ano do curso de Medicina na Afonso X, desde que previamente “completem a sua formação com algumas unidades extracurriculares e preencham os requisitos de acesso estabelecidos”.
Nos termos do acordo, que entra em vigor já no início do próximo ano lectivo, o número de vagas é de, no máximo, 30 alunos.
Para o CRN da OM, “a promoção de cursos privados de Medicina de qualidade e equivalências questionáveis comprometem seriamente o futuro da formação médica especializada”, tendo sido ultimamente promovidos cursos “de qualidade controversa e absolutamente desnecessários, como é o caso das Escolas Médicas do Algarve e de Aveiro”.
“Todos os estudos públicos conhecidos sobre as necessidades de médicos e a sua distribuição geográfica demonstram de forma inequívoca que não existe necessidade de novos cursos de Medicina para Portugal, protocolados ou não. O actual ‘numerus clausus’ dos sete cursos de Medicina, que já formam médicos de qualidade reconhecida há vários anos, ultrapassam claramente as necessidades futuras do país”, sustenta.
Segundo aquele conselho regional, “não é aceitável que a criação ou frequência de qualquer novo curso de Medicina não cumpra na íntegra as exigências de qualidade da formação pré-graduada que garantam uma formação médica sólida”, sendo que “só assim é possível evitar a existência de médicos de primeira e de segunda categoria, como já acontece noutros países”.
Assumindo-se como “a responsável pela qualidade do exercício técnico da Medicina em Portugal”, a Ordem diz sentir-se “na obrigação de, internamente, propor que os licenciados/mestres em Medicina sejam submetidos a um exame para a inscrição na OM”.
Adicionalmente, diz, “a OM já tomou a iniciativa de clarificar, de uma vez por todas, as necessidades de médicos das várias especialidades para os próximos anos”, tendo para isso solicitado ao Instituto de Estudos Geográficos da Universidade de Coimbra um estudo que “permitirá, a muito curto prazo, definir o plano demográfico médico a nível nacional”.
É que, recorda, “o próprio Governo reconheceu, a propósito dos despachos de indeferimento das solicitações de cursos de Medicina por universidades privadas, que ‘o excesso formativo dificilmente será acompanhado pela manutenção da qualidade do ensino da Medicina praticado em Portugal’ e que ‘os problemas organizativos de Saúde em Portugal não se resolvem aumentando o número de médicos mas sim racionalizando o sistema’.
“Como facilmente se entende, o problema não está no número total de médicos”, conclui o CRN da OM.
Fonte: Correio da Manhã, 31 de Julho de 2012